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domingo, 27 de setembro de 2020

Pensão alimentícia entre ex-cônjuges - STJ

 O STJ consolidou dentro do espaço "Pesquisa Pronta", o entendimento predominante no tribunal sobre a transitoriedade e excepcionalidade da pensão alimentícia fixada para ex-cônjuge.


"De acordo com a Quarta Turma, 'orienta-se a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça no sentido de que os alimentos entre ex-cônjuges devem ter caráter excepcional e transitório, salvo quando um deles não detenha mais condições de reinserção no mercado de trabalho ou de readquirir sua autonomia financeira, seja em razão da idade avançada ou do acometimento de problemas de saúde'.

A decisão foi tomada no HC 431.515, sob relatoria da ministra Isabel Gallotti."

sexta-feira, 5 de abril de 2019

Multiparentalidade: Sem sucesso em DNA, gêmeos idênticos terão de assumir pensão alimentícia de criança

Texto publicado originalmente no site "Migalhas".



Juiz reconheceu a má-fé de um dos irmãos em ocultar a parentalidade.
terça-feira, 2 de abril de 2019


Dois gêmeos idênticos terão de ser incluídos na certidão de nascimento de uma criança e também deverão pagar, cada um, pensão alimentícia para a menina. A determinação é do juiz de Direito Filipe Luis Peruca, de Cachoeira Alta/GO, que esteve diante de um impasse curioso: os exames de DNA revelaram a compatibilidade da criança com os dois homens e nenhum deles admitiu quem era o pai.
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Inicialmente, a mãe da criança havia ajuizado a ação de reconhecimento de paternidade contra um dos gêmeos. Ele se submeteu ao exame de DNA, e quando o resultado deu positivo, ele indicou seu irmão como o verdadeiro pai. Por sua vez, o irmão também fez o mesmo teste, dando resultado igual – 99,9% de chances de ser o genitor da menina.
A biologia explica a confusão. Como os gêmeos univitelinos se originam da divisão de um único óvulo fertilizado pelo mesmo espermatozoide, eles têm DNAs idênticos. 
Consta nos autos que os homens, desde a adolescência, se valem do fato de serem irmãos gêmeos idênticos. Um usava o nome do outro para angariar o maior número de mulheres e para ocultar a traição em seus relacionamentos. “Era comum, portanto, a utilização dos nomes dos irmãos de forma aleatória e dolosamente”, explicitou o magistrado.
O juiz também afirmou que não foi possível aferir, com segurança, qual dos gêmeos manteve relações sexuais com a mãe. Então, já que o exame de DNA foi ineficiente e os irmãos não admitiram a paternidade, o magistrado entendeu que a saída que melhor atende aos interesses da criança é reconhecimento da multiparentalidade.
“Um dos irmãos, de má-fé, busca ocultar a paternidade. Referido comportamento, por certo, não deve receber guarida do Poder Judiciário que, ao revés, deve reprimir comportamentos torpes, mormente no caso em que os requeridos buscam se beneficiar da própria torpeza, prejudicando o direito ao reconhecimento da paternidade biológica da autora, direito este de abrigo constitucional, inalienável e indisponível, intrinsecamente ligado à dignidade da pessoa humana (art. 1º, inciso 3, da Constituição da República)” 
Assim, o magistrado determinou que o nome de ambos seja incluído na certidão de nascimento da menina e que cada um pague pensão alimentícia no valor de 30% do salário mínimo.
Veja a sentença.

sexta-feira, 11 de março de 2016

STF: lei não pode definir licença maternidade distinta para gestantes e adotantes

Fonte: Portal Migalhas (link)


A legislação não pode prever a concessão de prazos diferenciados de licença-maternidade para servidoras públicas gestantes e adotantes. A decisão foi tomada pelo STF nesta quinta-feira, 10, em análise de recurso com repercussão geral reconhecida. Por maioria, seguindovoto do relator, Luís Roberto Barroso, os ministros fixaram a seguinte tese:
"Os prazos da licença adotante não podem ser inferiores aos prazos da licença gestante, o mesmo valendo para as respectivas prorrogações. Em relação à licença adotante, não é possível fixar prazos diversos em função da idade da criança adotada”
O RE 778.889 foi interposto contra acórdão do TRF da 5ª região que negou apelação de uma servidora pública Federal que pretendia obter licença-maternidade adotante, em equiparação ao prazo concedido para a licença gestante, em razão de ter recebido a guarda de uma criança menor de um ano. O TRF concluiu que a diferenciação de períodos não ofende o princípio da isonomia previsto na CF, uma vez que cada mulher apresenta diferentes necessidades. A servidora, por sua vez, alegou que a licença-maternidade não equivale a uma licença médica para recuperação pós-parto, mas ao estabelecimento do laço afetivo entre mãe e filho e aos cuidados com a saúde da criança.
Relator do processo, ministro Luís Roberto Barroso pontuou que nada na realidade das adoções e muito menos na realidade das adoções tardias indica que crianças mais velhas precisem de menos cuidados ou de menos atenção do que bebês. "É justamente o contrário. E, além disso, é preciso criar estímulos para a adoção de crianças mais velhas."
O ministro observou que a licença maternidade prevista no artigo 7º, XVIII, da Constituição, abrange tanto a licença gestante quanto a licença adotante, ambas asseguradas pelo prazo mínimo de 120 dias. "Interpretação sistemática da Constituição à luz da dignidade da pessoa humana, da igualdade entre filhos biológicos e adotados, da doutrina da proteção integral, do princípio da prioridade e do interesse superior do menor."
Para o ministro, as crianças adotadas constituem grupo vulnerável e fragilizado. Demandam esforço adicional da família para sua adaptação, para a criação de laços de afeto e para a superação de traumas. Sendo, assim, impossível lhes conferir proteção inferior àquela dispensada aos filhos biológicos, que se encontram em condição menos gravosa. De acordo com seu voto, estaria assim violado o princípio da proporcionalidade.
"Ora, se, para filhos biológicos, conectados às suas mães desde o útero, jamais negligenciados, jamais abusados, jamais feridos, há necessidade de uma licença mínima de 120 dias, violaria o direito dos filhos adotados à igualdade e à proporcionalidade, em sua vertente de vedação à proteção deficiente, pretender que crianças em condições muito mais gravosas gozem de período inferior de convívio com as mães."
PGR
Em sua manifestação, o procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, afirmou que qualquer distinção que se faça entre as categorias de mãe deve ser entendida como uma "discriminação odiosa."
Mãe é simplesmente mãe, não há que se falar em mãe biológica, mãe adotiva, mãe de outra categoria que se queira, é mãe. E da mesma linha filho é filho, não se pode distinguir filho biológico, filho adotivo, ou outra categoria. O que a Constituição busca é a proteção da família."

Veja a íntegra do voto do ministro Luís Roberto Barroso.

segunda-feira, 9 de novembro de 2015

STJ: Filhos que renunciaram herança em favor da mãe e depois descobriram outros meios-irmãos não conseguem anular ato


Os filhos de uma viúva não conseguiram anular a renúncia a herança, feita para favorecer a mãe, depois da descoberta de que tinham outros irmãos filhos apenas do pai falecido. A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) confirmou entendimento da Justiça estadual de que está prescrita a ação para anulação do termo, ajuizada dez anos após a habilitação dos meios-irmãos no inventário.
Seguindo o voto do relator, ministro Raul Araújo, a turma concluiu que o caso trata de anulação de negócio jurídico viciado por erro. O prazo para ajuizamento da ação é de quatro anos a contar do ato de renúncia, de acordo com o Código Civil de 1916.
A morte do pai ocorreu em 1983, ano em que se deu a renúncia dos filhos para beneficiar a viúva, meeira no espólio. A renúncia é ato jurídico unilateral e espontâneo pelo qual o herdeiro abdica de ser contemplado na herança. No caso, não foi indicada a pessoa que seria favorecida pela renúncia, o que beneficia todos os demais herdeiros (até aquele momento, apenas a mãe).

Tentativa de retratação

Porém, quatro anos depois, em 1987, eles foram surpreendidos com o aparecimento dos outros dois herdeiros, filhos do falecido de um relacionamento extraconjugal, que pediram habilitação nos autos do inventário. A habilitação foi julgada procedente.
Alegando que foram induzidos a erro, os filhos pediram que a renúncia fosse tomada como cessão de direitos em favor da mãe. O juiz concordou, mas os meios-irmãos anularam o termo de cessão, porque a conversão só poderia ocorrer em ação própria. Os filhos da viúva, então, em 1997, ajuizaram a ação, mas o direito foi considerado prescrito. O Tribunal de Justiça do Paraná confirmou a sentença.
No recurso analisado pelo STJ, o ministro Raul Araújo destacou que, como a renúncia é fruto de erro, o Código Civil de 1916, no artigo 1.590, permitia a retratação. No entanto, a redação do código estaria equivocada, pois não se trata de retratação, mas de anulação de ato por vício de consentimento. Tratando-se de anulação de negócio jurídico viciado por erro, incide o prazo decadencial do artigo 178, parágrafo 9º, V, "b", do CC/16, que é de quatro anos.
O atual Código Civil não prevê a possibilidade de retratação da renúncia. O artigo 1.812 diz que os atos de aceitação ou renúncia de herança são irrevogáveis.



STJ: Maternidade socioafetiva pode ser reconhecida após falecimento da mãe


É possível ajuizar reconhecimento de maternidade socioafetiva após falecimento da mãe

A Quarta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) reconheceu a possibilidade jurídica de se buscar o reconhecimento de maternidade socioafetiva após o falecimento da mãe. Com esse entendimento, o colegiado reformou decisões de primeiro e segundo graus da Justiça de São Paulo que consideraram o pedido juridicamente impossível.
O relator do recurso, ministro Marco Buzzi, afirmou que, no exame das condições da ação, considera-se juridicamente impossível o pedido que for manifestamente inadmissível, em abstrato. Ademais, não deve haver proibição legal expressa ao pedido.
No caso, Buzzi destacou que não existe lei que impeça o reconhecimento de maternidade com base na socioafetividade. “Diversamente, o ordenamento jurídico brasileiro tem reconhecido, cada vez com mais ênfase, as relações socioafetivas quando se trata de estado de filiação”, afirmou no voto.  

Reconhecimento póstumo

O processo conta que a filha foi adotada informalmente em 1956, no segundo dia de vida, pois a mãe biológica falecera no parto e o pai não tinha condições de cuidar dela. A mulher conviveu com sua mãe adotiva até o seu falecimento, em 2008. Contudo, a mãe nunca providenciou a retificação do registro civil da filha adotiva.
Ao extinguir o processo sem julgamento de mérito, a Justiça paulista considerou a falta de interesse da mãe em fazer a adoção formal em vida.
Segundo o ministro Marco Buzzi, em casos como esse, admite-se o reconhecimento da maternidade post mortem (depois da morte), com a possibilidade de constatar o estado de filiação com base no estabelecimento de vínculo socioafetivo.
Seguindo o voto do relator, a turma deu provimento ao recurso para reconhecer a possibilidade jurídica do pedido e determinar o retorno do processo à origem para julgamento de mérito.


terça-feira, 1 de setembro de 2015

Atraso de uma só prestação entre as últimas três autoriza prisão do devedor de alimentos

               
A execução ajuizada com o fim de cobrar uma única parcela de alimentos pode autorizar o decreto de prisão, desde que a parcela seja atual, isto é, compreendida entre as três últimas devidas. Esse foi o entendimento da Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) ao negar um recurso em habeas corpus.

O caso trata de alimentos devidos a ex-mulher. O relator, ministro João Otávio de Noronha, observou que a ação foi proposta para cobrar a última parcela vencida e também as que se viesse a se vencer.

De acordo com informações do tribunal local, quando decretada a prisão, nove meses após o ajuizamento da ação, nenhuma parcela dos alimentos havia sido paga – nem a cobrada na execução nem as que se venceram depois. Para o ministro, o quadro demonstra que a ordem de prisão é legal.

Segundo Noronha, o processo revela que o não pagamento foi deliberado e que não foram apresentadas justificativas para o inadimplemento. A defesa do ex-marido alega que ele seria credor da ex-mulher e que os valores deveriam ser compensados.

O relator recordou jurisprudência do STJ segundo a qual “o débito alimentar que autoriza a prisão civil é o que compreende as três prestações anteriores ao ajuizamento da execução” (Súmula 309).

Portanto, até três meses, o caráter de urgência está presente, “de forma que, se se tratasse apenas de cobrança de prestações antigas, a prisão não seria legal”.

O julgamento ocorreu no último dia 6.


Fonte: STJ (link)

Recusa de herdeiros ao exame de DNA também gera presunção de paternidade

              
A recusa imotivada da parte investigada – mesmo que sejam os herdeiros do suposto pai – a se submeter ao exame de DNA gera presunção relativa de paternidade, como determina a Súmula 301 do Superior Tribunal de Justiça (STJ). Com base nesse entendimento, a Terceira Turma rejeitou recurso de herdeiros contra decisão que reconheceu um cidadão como filho legítimo do pai deles.

Segundo o relator do recurso, ministro Villas Bôas Cueva, a súmula “é a aplicação direta da vedação do venire contra factum proprium, porque obstaculizar a realização do exame de DNA possui o evidente intento de frustrar o reconhecimento da paternidade”. No caso, o tribunal de segunda instância reconheceu a paternidade com base em testemunhos e provas documentais, chegando a afirmar que ela "era de conhecimento de todos".

Entre outros pontos, os herdeiros contestaram a aplicação da presunção contra eles ao argumento de que só seria válida em caso de recusa pessoal do suposto pai. No entanto, conforme explicou o ministro, na ação de paternidade posterior à morte, a legitimidade passiva recai sobre os herdeiros ou sucessores do falecido, “que, por isso mesmo, sujeitam-se ao ônus de se defender das alegações aduzidas pelo autor”.

Exumação

Ainda de acordo com o relator, se as provas do processo forem consideradas suficientes para se presumir a paternidade, não é necessária a exumação de cadáver para fazer exame de DNA. Ele disse que o STJ já firmou tese no sentido de que “a exumação de cadáver, em ação de investigação de paternidade, para realização de exame de DNA, é faculdade conferida ao magistrado pelo artigo 130 do Código de Processo Civil”.

Villas Bôas Cueva ressaltou que o tribunal estadual nem cogitou da necessidade de exumação, pois o contexto fático-probatório dos autos foi considerado suficiente para o julgamento da causa.

“A prova testemunhal e o comportamento processual dos herdeiros do réu conduziram à certeza da paternidade. Assim, o reconhecimento da paternidade reafirmada pelo tribunal de origem, fundamentada no conjunto fático-probatório apresentado e produzido durante a instrução, não pode ser desconstituída em sede de recurso especial, porque vedado o reexame de matéria de prova produzida no processo”, afirmou o relator.


Direito indisponível

No recurso, os herdeiros também contestaram a conclusão do tribunal estadual a respeito de um acordo feito no passado para encerrar outra ação de investigação de paternidade, ocasião em que o autor, suposto filho, recebeu expressiva quantia em dinheiro para desistir do processo.

Para a corte local, a existência daquele acordo corrobora as outras provas, pois a viúva e os herdeiros não teriam firmado o pacto se não tivessem pleno conhecimento de que o autor da ação era mesmo filho biológico do falecido.

Os herdeiros sustentaram que nenhuma outra conclusão poderia ser tirada do acordo a não ser o fato de que o autor “manteve seu estado de filiação” e deu quitação de eventuais direitos hereditários.

Sobre isso, Villas Bôas Cueva comentou que o acordo não afasta a possibilidade de reconhecimento da paternidade, visto que se trata de direito indisponível, imprescritível e irrenunciável, ou seja, ninguém é obrigado a abdicar de seu próprio estado, que pode ser reconhecido a qualquer tempo.

A decisão da turma foi unânime.


Fonte: STJ (link)

quarta-feira, 8 de abril de 2015

Adoção de adulto pelo padrasto dispensa consentimento de pai biológico

Fonte: STJ (link)

A Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) manteve a adoção de jovem maior de idade pelo padrasto, mesmo sem o consentimento do pai biológico. Segundo a decisão, uma vez estabelecido o vínculo afetivo, a adoção de pessoa maior não pode ser recusada sem justa causa pelo pai biológico, em especial quando existe manifestação livre de vontade de quem pretende adotar e de quem pode ser adotado.
No caso, um homem ajuizou ação de adoção de maior de idade combinada com destituição do vínculo paterno. Ele convive com a mãe do jovem desde 1993 e o cria desde os dois anos. Sem contato com o filho há mais de 12 anos, o pai biológico foi citado na ação e apresentou contestação.
O juiz de primeiro grau permitiu a adoção, considerando desnecessário o consentimento do pai biológico por se tratar de pessoa maior de idade, e determinou a troca do nome do adotando e o cancelamento do registro civil original.
A apelação do pai biológico foi negada em segunda instância, o que motivou o recurso ao STJ. Ele alegou violação do artigo 1.621 do Código Civil e do artigo 45 do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), pois seria indispensável para a adoção o consentimento de ambos os pais biológicos, mesmo quando um deles exerce sozinho o poder familiar.

Interesse do adotando

De acordo com o processo, o próprio pai biológico reconheceu que não tinha condições financeiras nem psicológicas para exercer seu direito de visitas e que preferiu permanecer afastado. O último contato pessoal ocorreu quando o filho tinha cerca de sete anos. Quando a ação de adoção foi proposta, ele estava com 19 anos.
O ministro Villas Bôas Cueva, relator do recurso, afirmou que o ECA deve ser interpretado sob o prisma do melhor interesse do adotando. “A despeito de o pai não ser um desconhecido completo, a realidade dos autos explicita que nunca desempenhou a função paternal, estando afastado do filho por mais de 12 anos, tempo suficiente para estremecer qualquer relação, permitindo o estreitamento de laços com o pai socioafetivo”, observou.
O ministro destacou que o direito discutido envolve a defesa de interesse individual e disponível de pessoa maior e plenamente capaz, que não depende do consentimento dos pais ou do representante legal para exercer sua autonomia de vontade. Nesse sentido, o ordenamento jurídico autoriza a adoção de maiores pela via judicial quando constituir efetivo benefício para o adotando (artigo 1.625 do Código Civil).



quarta-feira, 1 de abril de 2015

Um sonho sem restrições


Ricardo Cassiano

Especial do TRF da 1ª Região (link)

ESPECIAL: Um sonho sem restrições

O sonho de ser mãe tem levado milhares de mulheres a buscar métodos alternativos de fertilização. E para uma ampla maioria, as técnicas vêm funcionando bem. Estima-se que, em todo o mundo, mais de um milhão de crianças já vieram à luz por meio da reprodução humana assistida. À medida que os procedimentos evoluem, mais e mais pessoas enxergam, na ciência, a esperança de conquistar o bem mais almejado: uma nova “vida”.

Nessa trilha, contudo, candidatas a mamães encontram inúmeros desafios, que vão desde limitações financeiras e fatores genéticos até restrições impostas por lei. Nesse contexto, recaiu sobre a Justiça Federal da 1ª Região a análise de uma restritiva que afeta uma parcela expressiva da população feminina interessada nas técnicas alternativas de reprodução. Em decisão recente, a desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), confirmou liminar garantindo que uma mulher com mais de 50 anos se submeta a tratamento para engravidar.

A limitação havia sido estabelecida dois anos atrás pelo Conselho Federal de Medicina (CFM). A Resolução CFM 2.103/2013 estipulou a idade máxima para as pacientes, como forma de assegurar a saúde das mães e dos futuros bebês. No processo movido por um casal de Uberlândia/MG, no entanto, o impedimento foi derrubado liminarmente pela 1ª Vara Federal na cidade. O mérito da ação (pedido principal) ainda não foi julgado em primeira instância, mas o Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais (CRM/MG) recorreu ao TRF1 na tentativa de anular a liminar. O pedido acabou negado pela desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso.

Com a concessão da liminar, o casal está temporariamente autorizado a realizar o procedimento de fertilização in vitro – com a utilização de óvulos cedidos por um doador anônimo –, sem a interferência do CRM, que, de acordo com a Resolução 2.103, poderia intervir abrindo processo ético-disciplinar contra o médico.

Para o ex-diretor da Rede Latino-americana de Reprodução Assistida, Selmo Geber, a idade da paciente é um fator que não pode ser cegamente ignorado nos procedimentos de fertilização. Quanto mais velha, mais vulnerável a mulher ficará. E os riscos são maiores depois dos 50 anos. “Há um aumento no risco de pressão alta, diabetes e prematuridade”, aponta Geber. O médico, contudo, é ponderado ao afirmar que é baixa a incidência de complicações mais sérias, e que, assim como em mulheres jovens, a maioria dos casos podem ser acompanhados e tratados. Para ele, a fixação de idade máxima deveria ser apenas uma recomendação em vez de uma regra.

A Resolução do CFM prevê que apenas mulheres com boa condição de saúde, avaliadas individualmente pelos conselhos regionais de medicina, sejam autorizadas a se submeter às técnicas de reprodução assistida. Para a desembargadora federal Maria do Carmo Cardoso, a medida representa afronta à garantia de liberdade de planejamento familiar prevista no artigo 226 da Constituição Federal (regulada pela Lei 9.263/1996). “A generalização do limite etário estabelecido na Resolução, conquanto demonstre a preocupação do Conselho Federal de Medicina com riscos e problemas decorrentes da concepção tardia, desconsidera peculiaridades de cada indivíduo e não pode servir de obstáculo à fruição do direito ao planejamento familiar, a afetar, em última instância, a dignidade da pessoa humana”, pontuou a magistrada.

Na decisão que confirmou a liminar favorável ao casal de Uberlândia, a desembargadora também destacou o conteúdo do Enunciado 41, aprovado na I Jornada de Direito da Saúde do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), em maio de 2014. O texto reforça a tese de que o limite de 50 anos contraria a liberdade de planejamento familiar.

Números

O impacto da Resolução 2.103 é sentido por uma parcela significativa das mulheres que buscam tratamento para engravidar. De acordo com dados do Registro Latino-americano de Reprodução Assistida (RLA), dos 47,3 mil procedimentos registrados na América Latina em 2012 – pesquisa mais recente –, 31% foram realizados em pacientes acima dos 40 anos de idade e 8% em mulheres com mais de 43 anos.

No Brasil, o mercado de produção e doação de embriões humanos para fertilização artificial ou para pesquisas com células-tronco é regulamentado pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária. A Anvisa reconhece 93 clínicas em atividade no país, chamadas de Bancos de Células e Tecidos Germinativos (BCTGs). Juntas, as unidades somaram, em 2013, 52.690 transferências de embriões para pacientes por meio da fertilização in vitro – técnica mais comum. O dado consta do último relatório anual do Sistema Nacional de Produção de Embriões (SisEmbrio), divulgado em julho de 2014 pela Anvisa. A Região Sudestes lidera o ranking de embriões congelados, com 66% dos 38 mil embriões armazenados no país.

Nos últimos três anos, a reprodução assistida atingiu padrões internacionais no Brasil e, desde então, vem se mantendo nesse patamar. A média nacional de sucesso nos procedimentos foi de 74% em 2013, segundo o SisEmbrio. A taxa de fertilização sugerida na literatura internacional varia entre 65% e 75%. Para garantir a qualidade dos serviços prestados pelas clínicas, no entanto, a fiscalização é um fator essencial.  Na decisão contrária à limitação de idade imposta pelo CFM, a desembargadora Maria do Carmo Cardoso ressaltou a competência fiscalizatória, prevista em lei, dos conselhos regional e federal de medicina.

“Embora se deva afastar, in casu, a restrição etária para a reprodução assistida, a fiscalização das conclusões médicas decorrentes da avaliação clínica, da utilização da técnica e dos efeitos daí decorrentes – em relação à gestante e ao feto, se efetivamente concebido – permanecem na seara de atuação dos agravantes”, alertou a magistrada. Com bom planejamento, com a escolha certa da clínica médica e do tratamento mais adequado, e com o olhar atento das autoridades, a frustração de não poder gerar um filho de forma natural pode transformar-se na alegria de uma gestação saudável e tranquila. Mesmo depois dos 50 anos.



Assessoria de Comunicação Social
Tribunal Regional Federal da 1ª Região

segunda-feira, 30 de março de 2015

A fé na justiça dos homens

Fonte: STJ (link)

Fé é a certeza das coisas que se esperam e a convicção de fatos que não se veem (Hebreus 11:1). A crença religiosa dispensa lógica e razão. Quem crê, crê e pronto. É algo que, teoricamente, não se discute. Um direito fundamental reconhecido pela Constituição de 1988.

Isso não significa, entretanto, que não existam limites ao que é feito em nome da liberdade de crença. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), por exemplo, já encerrou muitas discussões envolvendo atos abusivos praticados sob o manto da religião.

Um deles foi o julgamento do HC 268.459, que discutia a responsabilidade criminal de um casal pela morte da filha, de 13 anos.

A menina, portadora de anemia falciforme, foi levada ao hospital com uma crise de obstrução dos vasos sanguíneos. Alertados pelos médicos de que seria necessário realizar uma transfusão, os pais não autorizaram o procedimento invocando preceitos religiosos das Testemunhas de Jeová.

Em primeira instância, os pais foram pronunciados para ir a júri popular, acusados de homicídio com dolo eventual, decisão mantida em segunda instância.

No STJ, a Sexta Turma entendeu pelo trancamento da ação penal. Para o colegiado, os pais não poderiam ser responsabilizados porque, ainda que fossem contra o procedimento, não tinham o poder de impedi-lo, já que a menina estava internada. Os médicos é que deveriam ter agido e cumprido seu dever legal, mesmo diante da resistência da família.

O julgamento ficou empatado, e como nesses casos a regra é prevalecer a posição mais favorável, o habeas corpus foi concedido. No acórdão, ficou registrado o entendimento de que a invocação religiosa deve ser indiferente aos médicos, que têm o dever de salvar a vida.

Intolerância

Outro caso de grande repercussão envolveu a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD) e uma mãe de santo da Bahia. A religiosa enfartou depois de ler uma matéria publicada no jornal Folha Universal, de propriedade da IURD, na qual era acusada de charlatanismo e de roubar os clientes. A capa do jornal estampava uma foto da mãe de santo com a manchete:“Macumbeiros charlatões lesam o bolso e a vida dos clientes”.

A mãe de santo faleceu dias depois. A família, então, iniciou uma luta judicial contra a igreja. Em ação por danos morais, a IURD foi condenada ao pagamento de quase R$ 1 milhão em razão de ofensa ao artigo 5º, inciso X, da Constituição Federal (proteção à honra, vida privada e imagem). Além disso, foi condenada também a publicar uma retratação à mãe de santo na Folha Universal.

No recurso especial, entretanto, o valor da indenização foi reduzido para R$ 145.250,00. O desembargador Carlos Fernando Mathias de Souza, então convocado para atuar no STJ, considerou o valor original exorbitante em relação aos critérios adotados no tribunal para reparações de cunho moral.

O episódio inspirou a criação do Dia Nacional de Combate à Intolerância Religiosa, 21 de janeiro, data da morte da mãe de santo (REsp 913.131). 

Dízimos

O dízimo é a contribuição religiosa do fiel. Ele ocorre tanto em igrejas evangélicas quanto em católicas e significa a décima parte da renda mensal doada à igreja como manifestação de fé e gratidão por bênçãos recebidas.

Um fiel arrependido tentou reaver na Justiça valores colocados no altar da Igreja Adventista do Sétimo Dia. Para ele, as doações realizadas seriam passíveis de revogação por ingratidão.

O caso aconteceu em São Paulo. Após desentendimento com um pastor, o fiel saiu da igreja e moveu ação de revogação das doações, com pedido de restituição das quantias. 

O pedido foi julgado improcedente em primeira e segunda instância, e a discussão chegou ao STJ no REsp 137.1842. O relator, ministro Sidnei Beneti (hoje aposentado), também não acolheu a argumentação do fiel arrependido.

Beneti destacou que a palavra doação admite duas interpretações: a doação em sentido amplo e a doação como negócio jurídico. Para ele, as contribuições realizadas às instituições religiosas não se enquadram na definição de doação como contrato típico, prevista no artigo 538 do Código Civil.

“A doação lato sensu a instituições religiosas ocorre em favor da pessoa jurídica da associação, e não da pessoa física do pastor, do padre ou da autoridade religiosa que a representa. Nesse contexto, a doação não pode ser revogada por ingratidão, tendo em vista que o ato de um membro – pessoa física – não tem o condão de macular a doação realizada em benefício da entidade, pessoa jurídica, como dever de consciência religiosa”, explicou Beneti.

Casamento anulado

Em 2013, o STJ homologou pela primeira vez uma sentença eclesiástica que anulou um casamento religioso, confirmada pelo Supremo Tribunal da Assinatura Apostólica, no Vaticano, com base no acordo firmado entre o Brasil e a Santa Sé relativo ao Estatuto Jurídico da Igreja Católica no Brasil (Decreto 7.107/10).

O decreto estabelece que as decisões eclesiásticas confirmadas pelo órgão superior de controle da Santa Sé são consideradas sentenças estrangeiras, com valor legal no Brasil. Com a decisão do STJ, os ex-cônjuges passaram de casados para solteiros, uma vez que a homologação da sentença eclesiástica resultou também na anulação do casamento em termos civis.

O pedido de anulação do casamento foi feito pelo marido ao Tribunal Eclesiástico Interdiocesano de Vitória, após a denúncia de que a esposa abusava sexualmente dos filhos.

Embora o acordo com a Santa Sé tenha sido apresentado como decorrente de relações internacionais entre estados, ele chegou a ser alvo de muitos questionamentos por envolver o interesse específico de uma religião, num estado constitucionalmente estabelecido como laico.

Injúria

Em julgamento realizado na Corte Especial, o STJ diferenciou discriminação religiosa de injúria qualificada. Uma mulher moveu ação penal privada contra um promotor que havia testemunhado em processo no qual ela acusava o ex-marido de atentado violento ao pudor. As vítimas seriam os filhos do casal.

De acordo com a mulher, o promotor, em seu depoimento, declarou que ela seria “emocionalmente desequilibrada” e “religiosa fanática da igreja do bispo Edir Macedo”. Disse ainda que ela havia colocado em sua casa duas empregadas domésticas da igreja à qual pertence e que de uma delas partiram as acusações contra o ex-marido.

Para a mulher, as declarações do promotor teriam sido feitas com o propósito de desqualificá-la – e também às suas empregadas –, denotando intolerância, discriminação, preconceito contra membros de segmento religioso e ainda a ideia de superioridade de quem não pertence àquela igreja.

Por unanimidade, os ministros rejeitaram a acusação, acolhendo a argumentação do promotor de que utilizou o termo “fanática” apenas como sinônimo de comportamento exagerado, sem a intenção de qualificar a religião.

Para o colegiado, a maneira como o promotor se referiu à igreja frequentada pela mulher, no contexto dos fatos, não implicou discriminação religiosa, mas uma declaração pessoal de caráter injurioso, visando a ofensa à honra, e não a discriminação.

“Se a intenção for ofender número indeterminado de pessoas ou, ainda, traçar perfil depreciativo ou segregador de todos os frequentadores de determinada igreja, o crime será de discriminação religiosa. Contudo, se o objetivo for apenas atacar a honra de determinada pessoa, valendo-se para tanto de sua crença religiosa – meio intensificador da ofensa –, o delito em questão é o de injúria qualificada, nos estritos termos do artigo 140, parágrafo 3º, do Código Penal”, disse o ministro Castro Meira (já aposentado), relator do processo.



Os números de alguns processos mencionados no texto não foram divulgados em razão de segredo judicial.


quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

Revisão jurisprudencial 2014 - Direito Civil e Empresarial - STJ - Informativos 534 a 538



DIREITO CIVIL. PRORROGAÇÃO AUTOMÁTICA DE FIANÇA EM CONTRATO DE MÚTUO BANCÁRIO.

Havendo expressa e clara previsão contratual da manutenção da fiança prestada em contrato de mútuo bancário em caso de prorrogação do contrato principal, o pacto acessório também é prorrogado automaticamente. O contrato de mútuo bancário tem por característica ser, em regra, de adesão e de longa duração, vigendo e renovando-se periodicamente por longo período. A fiança, elemento essencial para a manutenção do equilíbrio contratual do mútuo bancário, tem como características a acessoriedade, a unilateralidade, a gratuidade e a subsidiariedade. Além disso, não se admite, na fiança, interpretação extensiva de suas cláusulas, a fim de assegurar que o fiador esteja ciente de todos os termos do contrato de fiança firmado, inclusive do sistema de prorrogação automática da garantia. Esclareça-se, por oportuno, que não admitir interpretação extensiva significa tão somente que o fiador responde, precisamente, por aquilo que declarou no instrumento da fiança. Nesse contexto, não há ilegalidade na previsão contratual expressa de que a fiança prorroga-se automaticamente com a prorrogação do contrato principal. Com efeito, como a fiança tem o propósito de transferir para o fiador o risco do inadimplemento, tendo o pacto contratual previsto, em caso de prorrogação da avença principal, a sua prorrogação automática – sem que tenha havido notificação resilitória, novação, transação ou concessão de moratória relativamente à obrigação principal –, não há falar em extinção da garantia pessoal. Ressalte-se, nesse ponto, que poderá o fiador, querendo, promover a notificação resilitória nos moldes do disposto no art. 835 do CC, a fim de se exonerar da fiança. REsp 1.374.836-MG, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 3/10/2013.

DIREITO CIVIL. INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS A PESSOA JURÍDICA DE DIREITO PÚBLICO.
A pessoa jurídica de direito público não tem direito à indenização por danos morais relacionados à violação da honra ou da imagem. A reparaçaõ integral do dano moral, a qual transitava de forma hesitante na doutrina e jurisprudência, somente foi acolhida expressamente no ordenamento jurídico brasileiro com a CF/1988, que alçou ao catálogo dos direitos fundamentais aquele relativo à indenização pelo dano moral decorrente de ofensa à honra, imagem, violação da vida privada e intimidade das pessoas (art. 5º, V e X). Por essa abordagem, no atual cenário constitucional, a indagação sobre a aptidão de alguém de sofrer dano moral passa necessariamente pela investigação da possibilidade teórica de titularização de direitos fundamentais. Ocorre que a inspiração imediata da positivação de direitos fundamentais resulta precipuamente da necessidade de proteção da esfera individual da pessoa humana contra ataques tradicionalmente praticados pelo Estado. Em razão disso, de modo geral, a doutrina e jurisprudência nacionais só têm reconhecido às pessoas jurídicas de direito público direitos fundamentais de caráter processual ou relacionados à proteção constitucional da autonomia, prerrogativas ou competência de entidades e órgãos públicos, ou seja, direitos oponíveis ao próprio Estado, e não ao particular. Porém, em se tratando de direitos fundamentais de natureza material pretensamente oponíveis contra particulares, a jurisprudência do STF nunca referendou a tese de titularização por pessoa jurídica de direito público. Com efeito, o reconhecimento de direitos fundamentais – ou faculdades análogas a eles – a pessoas jurídicas de direito público não pode jamais conduzir à subversão da própria essência desses direitos, que é o feixe de faculdades e garantias exercitáveis principalmente contra o Estado, sob pena de confusão ou de paradoxo consistente em ter, na mesma pessoa, idêntica posição jurídica de titular ativo e passivo, de credor e, a um só tempo, devedor de direitos fundamentais. Finalmente, cumpre dizer que não socorrem os entes de direito público os próprios fundamentos utilizados pela jurisprudência do STJ e pela doutrina para sufragar o dano moral da pessoa jurídica. Nesse contexto, registre-se que a Súmula 227 do STJ (“A pessoa jurídica pode sofrer dano moral”) constitui solução pragmática à recomposição de danos de ordem material de difícil liquidação. Trata-se de resguardar a credibilidade mercadológica ou a reputação negocial da empresa, que poderiam ser paulatinamente fragmentadas por violações de sua imagem, o que, ao fim, conduziria a uma perda pecuniária na atividade empresarial. Porém, esse cenário não se verifica no caso de suposta violação da imagem ou da honra de pessoa jurídica de direito público. REsp 1.258.389-PB, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 17/12/2013.

DIREITO CIVIL. OBRIGAÇÃO DE PRESTAR ALIMENTOS.
O espólio de genitor do autor de ação de alimentos não possui legitimidade para figurar no polo passivo da ação na hipótese em que inexista obrigação alimentar assumida pelo genitor por acordo ou decisão judicial antes da sua morte.De fato, o art. 23 da Lei do Divórcio e o art. 1.700 do CC estabelecem que a “obrigação de prestar alimentos transmite-se aos herdeiros do devedor”. Ocorre que, de acordo com a jurisprudência do STJ e com a doutrina majoritária, esses dispositivos só podem ser invocados se a obrigação alimentar já fora estabelecida anteriormente ao falecimento do autor da herança por acordo ou sentença judicial. Isso porque esses dispositivos não se referem à transmissibilidade em abstrato do dever jurídico de prestar alimentos, mas apenas à transmissão (para os herdeiros do devedor) de obrigação alimentar já assumida pelo genitor por acordo ou decisão judicial antes da sua morte. Precedentes citados: AgRg no REsp 981.180/RS, Terceira Turma, DJe 15/12/2010; e REsp 1.130.742/DF, Quarta Turma, DJe 17/12/2012. REsp 1.337.862-SP, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 11/2/2014.

 DIREITO CIVIL. INAPLICABILIDADE DA SÚMULA 332 DO STJ À UNIÃO ESTÁVEL.
Ainda que a união estável esteja formalizada por meio de escritura pública, é válida a fiança prestada por um dos conviventes sem a autorização do outro. Isso porque o entendimento de que a “fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia” (Súmula 332 do STJ), conquanto seja aplicável ao casamento, não tem aplicabilidade em relação à união estável. De fato, o casamento representa, por um lado, uma entidade familiar protegida pela CF e, por outro lado, um ato jurídico formal e solene do qual decorre uma relação jurídica com efeitos tipificados pelo ordenamento jurídico. A união estável, por sua vez, embora também represente uma entidade familiar amparada pela CF – uma vez que não há, sob o atual regime constitucional, famílias estigmatizadas como de "segunda classe" –, difere-se do casamento no tocante à concepção deste como um ato jurídico formal e solene. Aliás, nunca se afirmou a completa e inexorável coincidência entre os institutos da união estável e do casamento, mas apenas a inexistência de predileção constitucional ou de superioridade familiar do casamento em relação a outra espécie de entidade familiar. Sendo assim, apenas o casamento (e não a união estável) representa ato jurídico cartorário e solene que gera presunção de publicidade do estado civil dos contratantes, atributo que parece ser a forma de assegurar a terceiros interessados ciência quanto a regime de bens, estatuto pessoa, patrimônio sucessório, etc. Nesse contexto, como a outorga uxória para a prestação de fiança demanda absoluta certeza por parte dos interessados quanto à disciplina dos bens vigente, e como essa segurança só é obtida por meio de ato solene e público (como no caso do casamento), deve-se concluir que o entendimento presente na Súmula 332 do STJ – segundo a qual a “fiança prestada sem autorização de um dos cônjuges implica a ineficácia total da garantia” –, conquanto seja aplicável ao casamento, não tem aplicabilidade em relação à união estável. Além disso, essa conclusão não é afastada diante da celebração de escritura pública entre os consortes, haja vista que a escritura pública serve apenas como prova relativa de uma união fática, que não se sabe ao certo quando começa nem quando termina, não sendo ela própria o ato constitutivo da união estável. Ademais, por não alterar o estado civil dos conviventes, para que dela o contratante tivesse conhecimento, ele teria que percorrer todos os cartórios de notas do Brasil, o que seria inviável e inexigível. REsp 1.299.866-DF, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/2/2014.

DIREITO CIVIL. TERMO INICIAL DOS JUROS DE MORA DE OBRIGAÇÃO POSITIVA, LÍQUIDA E COM TERMO CERTO.
Em ação monitória para a cobrança de débito decorrente de obrigação positiva, líquida e com termo certo, deve-se reconhecer que os juros de mora incidem desde o inadimplemento da obrigação se não houver estipulação contratual ou legislação específica em sentido diverso. De início, os juros moratórios são os que, nas obrigações pecuniárias, compensam a mora, para ressarcir o credor do dano sofrido em razão da impontualidade do adimplemento. Por isso, sua disciplina legal está inexoravelmente ligada à própria configuração da mora. É importante destacar que, por se tratar de direito disponível, as partes podem convencionar o percentual dos juros de mora e o seu termo inicial, hipótese em que se fala em juros de mora contratual. Quando, porém, não há previsão contratual quanto a juros, ainda assim o devedor estará obrigado ao pagamento de juros moratórios, mas na forma prevista em lei (juros legais). Quanto ao aspecto legal, o CC estabelece, como regra geral, que a simples estipulação contratual de prazo para o cumprimento da obrigação já dispensa, uma vez descumprido esse prazo, qualquer ato do credor para constituir o devedor em mora. Aplica-se, assim, o disposto no art. 397 do CC, reconhecendo-se a mora a partir do inadimplemento no vencimento (dies interpellat pro homine) e, por força de consequência, os juros de mora devem incidir também a partir dessa data. Assim, nos casos de responsabilidade contratual, não se pode afirmar que os juros de mora devem sempre correr a partir da citação, porque nem sempre a mora terá sido constituída pela citação. O art. 405 do CC (“contam-se os juros de mora desde a citação inicial"), muitas vezes empregado com o objetivo de fixar o termo inicial dos juros moratórios em qualquer hipótese de responsabilidade contratual, não se presta a tal finalidade. Geograficamente localizado em Capítulo sob a rubrica "Das Perdas e Danos", esse artigo disciplinaria apenas os juros de mora que se vinculam à obrigação de pagar perdas e danos. Ora, as perdas e danos, de ordinário, são fixadas apenas por decisão judicial. Nesse caso, a fixação do termo inicial dos juros moratórios na data da citação se harmoniza com a regra implícita no art. 397, caput, de que nas obrigações que não desfrutam de certeza e liquidez, a mora é ex persona, ou seja, constitui-se mediante interpelação do credor. Precedentes citados: REsp 1.257.846-RS, Terceira Turma, DJe 30/4/2012; e REsp 762.799-RS, Quarta Turma, DJe 23/9/2010. EREsp 1.250.382-PR, Rel. Min. Sidnei Beneti, julgado em 2/4/2014.

DIREITO EMPRESARIAL. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS EM CONTRATOS DE CRÉDITO RURAL. RECURSO REPETITIVO (ART. 543-C DO CPC E RES. 8/2008 DO STJ).
A legislação sobre cédulas de crédito rural admite o pacto de capitalização de juros em periodicidade inferior à semestral. Diante da pacificação do tema, publicou-se a Súmula 93 do STJ, segundo a qual “a legislação sobre cédulas de crédito rural, comercial e industrial admite o pacto de capitalização de juros". Assim, nas cédulas de crédito rural, industrial e comercial, a capitalização semestral dos juros possui autorização ex lege, não dependendo de pactuação expressa, a qual, por sua vez, é necessária para a incidência de juros em intervalo inferior ao semestral. Essa disciplina não foi alterada pela MP 1.963-17, de 31/3/2000. Com efeito, há muito é pacífico no STJ o entendimento de que, na autorização contida no art. 5º do Decreto-Lei 167⁄1967, inclui-se a permissão para a capitalização dos juros nas cédulas de crédito rural, ainda que em periodicidade mensal, desde que pactuada no contrato (“as importâncias fornecidas pelo financiador vencerão juros às taxas que o Conselho Monetário Nacional fixar e serão exigíveis em 30 de junho e 31 de dezembro ou no vencimento das prestações, se assim acordado entre as partes; no vencimento do título e na liquidação, por outra forma que vier a ser determinada por aquele Conselho, podendo o financiador, nas datas previstas, capitalizar tais encargos na conta vinculada a operação”). A autorização legal está presente desde a concepção do título de crédito rural pela norma específica, que no particular prevalece sobre o art. 4º do Decreto 22.626⁄1933 (Lei de Usura), e não sofreu qualquer influência com a edição da MP 1.963-17⁄2000 (2.170-36⁄2001). REsp 1.333.977-MT, Rel. Min. Maria Isabel Gallotti, julgado em 26/2/2014.

DIREITO CIVIL E PROCESSO CIVIL. PREÇO A SER DEPOSITADO PARA O EXERCÍCIO DO DIREITO DE PREFERÊNCIA EM ARRENDAMENTO RURAL.
Em ação de adjudicação compulsória proposta por arrendatário rural que teve desrespeitado o seu direito de preferência para a aquisição do imóvel, o preço a ser depositado para que o autor obtenha a transferência forçada do bem (art. 92, § 4°, da Lei 4.505/1964) deve corresponder àquele consignado na escritura pública de compra e venda registrada no cartório de registro de imóveis, ainda que inferior ao constante do contrato particular de compra e venda firmado entre o arrendador e o terceiro que tenha comprado o imóvel. De fato, o art. 92 do Estatuto da Terra (Lei 4.504/1964) e o art. 45 do Dec. 59.566/1966 (que regulamentou a lei) preveem expressamente o direito de preferência, legal e real, outorgado ao arrendatário como garantia do uso econômico da terra explorada por ele, direito que é exclusivo do preferente em adquirir o imóvel arrendado, em igualdade de condições, sendo uma forma de restrição ao direito de propriedade do arrendante. Dessa maneira, vendendo o arrendador o imóvel sem a notificação do arrendatário, aparece a pretensão do arrendatário em ver declarada a invalidade do negócio entre arrendador e o terceiro, adjudicando o imóvel ao preemptor, desde que realizada no prazo decadencial de seis meses, e desde que efetuado o depósito do preço. Realmente, no tocante ao preço, nem a lei nem o seu regulamento foram suficientemente claros sobre qual seria o valor a ser depositado. A interpretação sistemática e teleológica do comando legal leva à conclusão de que o melhor norte para definição do preço a ser depositado pelo arrendatário é aquele consignado na escritura pública de compra e venda registrada em cartório. Isso porque a própria lei estabelece como marco legal para o exercício do direito de preferência a data da transcrição da escritura pública no registro de imóveis, ou seja, confere ao arrendatário o prazo de 6 meses para depositar o preço constante do ato de alienação do imóvel a que teve conhecimento por meio da transcrição no cartório imobiliário. Nessa linha de intelecção, por consectário lógico, o arrendatário, ao tomar conhecimento do ato da alienação no registro de imóveis, verifica o preço lá declarado – constante da escritura pública – e efetua o depósito (se houver o intento na aquisição do imóvel), exercendo, no momento próprio, a faculdade que o ordenamento jurídico vigente lhe concedeu. Não se pode olvidar que a escritura pública é um ato realizado perante o notário que revela a vontade das partes na realização de negócio jurídico, revestida de todas as solenidades prescritas em lei, isto é, demonstra de forma pública e solene a substância do ato, gozando o seu conteúdo de presunção de veracidade, trazendo maior segurança jurídica e garantia para a regularidade da compra. Com efeito, referido instrumento é requisito formal de validade do negócio jurídico de compra de imóvel em valor superior a 30 salários mínimos (art. 108 do CC), justamente por sua maior segurança e por expressar a realidade econômica da transação, para diversos fins. Outrossim, não podem o arrendador e o terceiro se valerem da própria torpeza para impedir a adjudicação compulsória, haja vista que simularam determinado valor no negócio jurídico publicamente escriturado, mediante declaração de preço que não refletia a realidade, com o fito de burlar a lei ‑ pagando menos tributo. REsp 1.175.438-PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, julgado em 25/3/2014.




Decisão STJ - Imóvel não substitui depósito em dinheiro na execução provisória por quantia certa

  Notícia originalmente publicada no site do STJ, em 09/11/2021. Para a Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), em execução po...